A Filosofia, a ideia de liberdade e o problema do Mal

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“Porque não devemos dizer que a liberdade de vontade obteve o poder que possui no universo para a destruição, mas para a salvação de quem a possui.”

Proclo Lício, o Sucessor

Abordar o tema da liberdade em filosofia é algo que exige uma reflexão que parece nunca ter fim. O livre-arbítrio humano, se ele existe ou não, se somos um sistema fechado ou aberto, se podemos recriar-nos ou se somos determinados, sempre forneceu material para abordagens maravilhosas como para sofismas abomináveis. Temos além disso a liberdade política, liberdade de religião, liberdade sexual, etc. É impossível mencionar todos esses temas sem incluir Teologia e religião no meio. Liberdade é algo que todos falam, mas poucos querem exercê-la, ou mesmo sabem como fazer isso. É necessário responsabilidade individual e uma poderosa metafísica por detrás para que a liberdade apareça. [Read more…]

O amor como a primeira das paixões segundo São Tomás de Aquino

A filosofia cristã reflete repetidas vezes sobre a concupiscência, que é o amor aos bens desse mundo especialmente aos amores sensuais. Santo Agostinho escreveu sobre isso e São Tomás, na Idade Média, frequentemente alude a esse tema. Existe uma parte da Suma Teológica que fala sobre a ordem das paixões. Está na questão XXV. É curioso ler São Tomás escrevendo sobre o amor sensual pois ele nunca teve qualquer tipo de experiência nessa área. Mencionando Santo Agostinho, que diz que ” o amor desejando ardentemente possuir o seu objeto, é desejo; quando porém já o possui e o goza é alegria”, diz  São Tomás que o bem vem antes do mal, e todas a paixões que visam o bem são anteriores àquelas que querem o mal. Para ele o amor precede o desejo e este o deleite. Segue-se a afirmação de que o prazer é o gozo do bem, e este é o fim. Dessa forma foi possível São Tomás afirmar que o amor é a primeira das paixões do concupiscível, pois quando o objeto amado já é possuído, ele se torna uma fonte de prazer; porém, quando ainda está distante, o sentimento que existe é o de desejo ou de concupiscência, e Santo Agostinho diz que ” sente-se mais o amor quando é produzido pela carência”.

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Resenha das Confissões de Santo Agostinho

Confissões

“Tarde te amei…”

As confissões de Santo Agostinho foi o primeiro livro de filosofia que eu estudei mais profundamente, isso ainda na minha juventude, e esse fato me marcou profundamente. Essa autobiografia nos faz reviver e refletir sobre a vida de falsos caminhos e pecados de Agostinho. Seu desenvolvimento intelectual, a relação com seus amigos e com sua fantástica mãe- santa Mônica- podem nos servir como exemplo vida. É claro que alguns dos pensamentos de Santo Agostinho sobre sua vida pecadora são exagerados, como quando ele fala sobre seus maus pensamentos quando criança, sua sexualidade de jovem e a relação com uma mulher que ele não nomeia, parecem-nos ingênuos nos dias de hoje. É muito mais interessante a história de sua vida de estudante e sua adesão ao maniqueísmo.

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Resenha da Introdução ao estudo de Santo Agostinho, de Étienne Gilson

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Étienne Gilson foi um filósofo da tradição tomista e um dos maiores historiadores da filosofia patrística e medieval. Nessa ótima introdução ao pensamento de Santo Agostinho, Gilson faz um pequeno resumo de algumas das principais características da “filosofia” do santo. Filosofia está entre aspas porque o próprio Gilson reconhece que o pensamento de Agostinho é difícil de ser definido como uma filosofia. Complexa e inacabada, a obra de Santo Agostinho inspirou toda a Idade Média e filósofos modernos desde Descartes até Heidegger.

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O debate sobre a existência de Deus entre Frederick Copleston e Bertrand Russell

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O debate aconteceu em 1948 ,na rádio BBC. Bertrand Russell, filósofo e matemático, enfrentou um debate sobre a existência de Deus com o padre jesuíta Frederick Copleston. Russell era ateu e Copleston era obviamente católico. Segue abaixo minha tradução.

Copleston: Como nós vamos discutir a existência de Deus, deve ser benéfico chegarmos a um acordo provisório sobre o que nós entendemos pelo termo “Deus”. Eu presumo que nós entendemos um Ser supremo e pessoal, distinto do mundo e criador dele. Você estaria de acordo- provisoriamente, ao menos- em aceitar esta exposição como o significado do termo “Deus”?

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Resenha de Crime e Castigo, de Dostoiévski

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Crime e Castigo é um dos maiores romances da história e tem como uma característica o fato de ser um livro que reproduz a angústia psicológica de um personagem que desde o início já sabemos ser um assassino. O estilo de Dostoiévski é inconfundível, já que ele reproduz os pensamentos e as dúvidas mais íntimas dos personagens. O romance começa narrando a história de Raskólnikov, um estudante que vive de aluguel em um pequeno apartamento, no qual ele tem cada vez mais dificuldade em honrar seu compromisso . Raskólnikov ganha dinheiro fazendo pequenas traduções, no entanto, vive à beira da miséria. Como é um jovem muito neurótico e introspectivo,o estudante ( na verdade ex-estudante) durante seus vários momentos ociosos formula uma tese que pensa ser original: homens como César e Napoleão foram responsáveis por milhares de mortes, entretanto, foram considerados pela história como grandes heróis e conquistadores. Por que Raskólnikov pensa dessa maneira? Porque ele se vê oprimido pela velha- que no livro simboliza o capitalismo  devastador que  Dostoiévski tanto odiava.

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Resenha do Compêndio de Teologia, de São Tomás de Aquino

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Escrito no fim da vida de São Tomás, o Compêndio de Teologia resume algumas das principais doutrinas do Aquinate. Questões relativas à Trindade, do Filioque e sobre a perfeição de Deus são esclarecidas logo no início do livro. A linguagem utilizada por São Tomás é simples, da mesma forma como os exemplos de fenômenos da natureza, como o fogo, o qual ele se refere repetidas vezes. São Tomás tinha concepções errôneas em filosofia herdadas de Aristóteles como, por exemplo, a redução da mulher a um papel passivo, pois o filósofo grego acreditava que o sêmem do homem gerava a alma, e a mulher, o corpo. São Tomás repete esse erro, assim como adotou com algumas reservas o universo Ptolomaico, negando, porém, que os astros tivessem algum poder sobre o destino do homem. Seu maior equívoco foi em relação à Imaculada Conceição da Virgem Maria, exibindo um pensamento contraditório e titubeante. Foi outro escolástico, Duns Scot, que corrigiu o erro de São Tomás e estabeleceu o Dogma.

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Os Sermões Alemães, de Mestre Eckhart

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A Mística Medieval
Na presente obra são apresentados 60 sermões do Mestre Eckhart. Eu achei seus sermões muito parecidos uns com os outros. Eckhart tem um grande conhecimento das escrituras, assim como dos grandes teólogos e filósofos como Aristóteles, Santo Tomás, Santo Agostinho, Avicena, Maimônides, entre outros. Destaco o sermão 30, onde Eckhart diz que o que Deus criou milênios atrás, continua criando ainda hoje. Deus cria no mais íntimo e no mais alto da alma.

Eckhart nos recomenda que amemos a Deus de boa vontade na pobreza e na riqueza, na doença e na saúde, na tentação e na sua ausência. Ele lembra-nos dos apóstolos que quanto mais sofriam mais facilmente suportavam o sofrimento.Poderíamos fazer uma comparação entre Eckhart e o padre Antônio Vieira. Eckhart é mais metafísico, enquanto Vieira é mais político. Mas na construção de imagens frases e citações de autoridades, assim como na riqueza do uso da língua, Vieira é muito superior.

Eckhart foi acusado em vida de ter sido um herético, mas nos seus sermões não dá para perceber nenhum desvio da ortodoxia. Recomendo esse livro para quem gosta da filosofia medieval, e que esteja interessado em conhecer um de seus maiores místicos.

Resenha: A Cidade de Deus, de Santo Agostinho

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Santo Agostinho sempre foi considerado um teólogo de inspiração platônica mas, quando lemos sua obra principal, A Cidade de Deus, e a comparamos com a sobriedade das metafísicas de Plotino, Proclo, Jâmblico e Damáscio, vemos que o seu platonismo fica já obscurecido pela teologia bíblica. Agostinho dá um tom excessivamente bombástico e emocional ao seu texto, talvez porque misture a uma tentativa de filosofar teologia e história. Este caráter histórico de seu texto é um dos grandes pontos fracos do Cristianismo, e mesmo filósofos muçulmanos criticam este aspecto da religião cristã. Quando a filosofia é diminuída para dar espaço a uma religião que pretende ser histórica, e que vê seus antecessores como meros pretextos para seu aparecimento, a razão cede lugar para o emocional. [Read more…]

Psyché, de Bouguereau

 

A alma, o objeto de estudo da psicologia foi muito bem reproduzida nessa pintura de Bouguereau, no qual uma mulher jovem e muito bonita está olhando para o alto, e com as mãos no peito, simbolizando recato. A beleza da alma humana é representada nessa pintura.

São Tomás de Aquino reproduz o pensamento de Santo Agostinho que dizia que a alma contém a mente, o conhecimento e o amor, que estão nela essencialmente.  Santo Agostinho acrescenta que a memória, a inteligência e a vontade são uma só vida, um só espírito e uma só essência.São Tomás nega que a essência da alma seja sua potência, porque a potência e o ato dividem o ente e qualquer gênero de ente, sendo preciso que um e outro se refiram ao mesmo gênero, de forma que se o ato não pertence ao gênero substância, a potência não pode pertencer a esse gênero. A operação da alma não se encontra no gênero substância, pois somente em Deus sua operação é sua substância, de forma que a potência divina é a essência mesma de Deus.

Que a essência da alma não seja sua potência também pode ser visto na alma, pois esta é ato. A alma enquanto forma não é um ato ordenado para um ato superior, mas é o termo último da geração. Se ela está em potência para outro ato, isso não lhe cabe por sua essência, enquanto é uma forma, mas por sua potência. A alma enquanto sujeito de sua potência é o ato primeiro, ordenada para  um ato segundo. Aquilo que tem a alma não está sempre em ato nas operações vitais. A definição da alma ( Psyché) diz que ela é um ato de um corpo tendo a vida em potência. A potência, portanto, não exclui a alma. A essência da alma não é a sua potência. Nada está em potência com relação a um ato.