Sobre o Destino

 

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“Não alimentes o Destino, ou seja, não agregues ao Destino aquilo pelo qual você é responsável, pois assim não escaparás dele, e sim o aumentarás.”

Proclo, Comentário aos Oráculos Caldeus

Destino

No dia em que você foi gerado para o mundo,
Pelo modo no qual o sol permaneceu saudando os planetas
Controlou sua fortuna a partir daquele momento em diante,
Pelo horóscopo que prevaleceu em seu nascimento.
Você deve ser assim: não pode escapar de si mesmo;
Assim foi decretado pelas Sibilas e pelos profetas.
Nenhum poder, nenhuma extensão do tempo, pode quebrar a forma
Impressa no desenvolvimento da vida.

Esperança

Contudo, pode ser aberto, o portão assustador
Que conduz através de muros e barreiras sólidas,
Ainda que mantenha-se firme como rochas antigas.
Um espírito gentilmente se agita, e liberta a si mesmo;
Para fora das nuvens, da neblina e da água da chuva,
Ergue-se conosco e nos dá asas.
Você sabe muito bem, ele passeia por toda parte;
Uma batida de asa, e as eras caem por trás de nós.

Goethe, Palavras Órficas (tradução nossa a partir do inglês)

Dionísio como a mônada dos Titãs

 

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Imagem: Antínoo 110-130 d.C , amante do imperador Adriano, como o Deus Dionísio. Roma, Vaticano, Sala Rotonda

“Eu, filho de Zeus, vim para a terra de Tebas- Dionísio, a quem Sémele, filha de Cadmo, deu à luz, persuadida a fazer isto por um relâmpago, após ter modificado minha feição divina para uma forma humana.” (p.55)

“Tendo mudado sua aparência mortal de modo a revelar seu poder aos incrédulos Tebanos, e para punir Penteu, seu rei. Então ele diz: Por esta razão, mostrar-lhe-ei que sou um deus.” (p.57)
 
Os antigos oponentes do Cristianismo demonstraram o contraste entre a morte impotente de Jesus com o poder de Dionísio nas Bacantes! O filósofo Celso, que viveu no segundo século da Era Cristã, percebeu que Dionísio afirma: “o próprio Deus libertar-me-á quando eu quiser”, e o comparou com Jesus, que não pôde libertar-se a si mesmo. De acordo com Orígenes, Celso também escreveu assim: mas aquele que condenou a Jesus não conseguiu nem mesmo sofrer o destino de Penteu tornando-se louco ou sendo feito em pedaços” (p.150)
 
Dennis R. Macdonald, The Dyonisian Gospel, Fortress Press, 2017. (tradução nossa a partir do original em inglês)
 
“A alma, quando vive com as virtudes éticas e físicas, simboliza o reino de Dionísio; então ele é cortado em pedaços, porque estas virtudes não implicam uma a outra, portanto os Titãs comem da sua carne, e este mastigar implica na divisão extrema, pois Dionísio é o patrono deste mundo, onde a separação prevalece do que é meu e o que é teu. Nos Titãs, que o cortam em pedaços, o “tí” (algo, em grego) representa o particular, porque o universal é quebrado na gênesis (nascimento), e Dionísio é Mônada dos Titãs.
 
A explicação do neoplatônico Olimpiodoro, o Jovem (Ὀλύμπιόδωρος ὁ Νεώτερος), é que o assassinato de Dionísio representa o sofrimento da alma humana quando entra no domínio da gênesis.” (p.233)
 
Robbert Maarten van den Berg. Proclus’ Commentary on the Cratylus in Context: Ancient Theories of Language, Brill, 2007 (tradução nossa a partir do original em inglês)
 

A Lua do seu amor

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A Lua do seu amor

“Não há uma única alma

Que não possua um caminho para você.

Não há pedra,

Nem flor-

Nem um único pedaço de palha-

Que não tenha sua existência.

Em toda partícula do mundo,

A Lua de seu amor

Faz com que o coração

De cada átomo resplandeça.”

THE MOON OF YOUR LOVE

Not a single soul lacks 
a pathway to you.

There’s no stone, 
no flower— 
not a single piece of straw— 
lacking your existence.

In every particle of the world, 
the moon of your love 
causes the heart 
of each atom to glow.

Muhammad Shirin Maghribi, Iran/Persia (1349 – 1408)

Tradução nossa a partir do livro Love’s Alchemy: Poems from the Sufi tradition 

 

Safo de Lesbos: o primeiro beijo

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Marc Gabriel Charles Gleyre, Le Coucher de Sappho

 

O primeiro beijo

Coloquei abaixo a almofada
No sofá que ela,
Relaxada e inerte, estava.
Poderia oferecer seus lábios a mim.

Como uma sacerdotisa apaixonada,
No santuário de Afrodite,
Fascinada eu me inclinei acima dela
Com o senso do Divino.

Ela tinha, por sua natureza núbil,
Em anos ainda uma criança,
Nenhuma sugestão
De qualquer conhecimento secreto,
De nenhum pensamento de paixão.

Sua boca para a imolação
Estava preparada, e minha é a arte.
E um longo beijo de paixão
Deflorou seu coração virgem.

Tradução nossa a partir da versão em inglês do Delphi Complete Works of Sappho

Resenha: Prometeu e Epimeteu, de Carl Spitteler

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“Foi em sua juventude – a saúde estava queimando seu sangue e seus poderes cresciam dia a dia .

Então a arrogância de Prometeu falou completamente a Epimeteu, seu amigo e irmão:

Sejamos diferentes dos muitos que estão na multidão geral.

Pois, se seguirmos nosso costume no exemplo comum, seremos uma recompensa comum e nunca seremos bem-aventurados e profundos.”

Carl Spitteler, Prometheus und Epimetheus (tradução nossa a partir do original em alemão)

Es war in seiner Jugendzeit – Gesundheit rotete sein Blut und taglich wuchsen seine Krafte – .

Da sprach Prometheus Obermutes voll zu Epimetheus seinem Freund und Bruder:

Auf lass uns anders werden, als die Vielen, die da wimmein in dem allgemeinen HaufenI

Denn so wir nach gemeinem Beispiel richten unsern Brauch, so werden wir gemeinen Lohnes sein und werden nimmer sptiren adeliges Gluck und seelenvolle. [Read more…]

Resenha: O Nome da Rosa, de Umberto Eco

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O século XIV representou uma época de revoluções no pensamento e na tecnologia. Os óculos, o relógio mecânico e o uso militar mais disseminado da pólvora são daquele período. Na filosofia, após séculos de debates sobre a questão dos Universais, o Nominalismo tornar-se-ia dominante. Muito do destino da ciência moderna foi estabelecido a partir das ideias de Guilherme de Ockham. O romance de Umberto Eco, O Nome da Rosa, é a grande referência literária sobre um século tão catastrófico e inovador. [Read more…]

Uma reflexão atual a partir de um poema de W. H. Auden

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Man is changed by his living; but not fast enough. His concern to- day is for that which yesterday did not occur.

W.H.Auden, Selected Poems.

O grande poeta inglês Auden soube de maneira extraordinária, como todo gênio poético, colocar em versos os dramas do século XX. Faz-se necessário, mais do que nunca, que apareça algum poeta que saiba (especialmente no Brasil) captar nossas desgraças que, se não matam os corpos na escala do século XX, destroem nossas almas, nossa cultura e nosso futuro.

Auden possui um poema que é exemplar para que possamos exprimir nosso sentimento atual: chama-se  September 1, 1939, sobre a Segunda Guerra. Reproduzo-o a seguir: [Read more…]

Resenha: A Relíquia, de Eça de Queiroz

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O grande escritor português Eça de Queiroz, que considero superior a Machado de Assis, foi bastante polêmico e ousado em seu romance A Relíquia. Em sua época, muito influenciado pela obra de Ernest Renan “Vida de Jesus”, que recriava a narrativa do Evangelho sem os aspectos sobrenaturais, a obra de Eça de Queiroz serviria de base também para outro escritor português, José Saramago, em seu livro “O Evangelho segundo Jesus Cristo”. A Relíquia denuncia uma sociedade falsamente religiosa, no qual o parecer ser é mais importante do que ser. [Read more…]

Resenha: Là-bas, de Joris-Karl Huysmans

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Resenha escrita a partir da edição original em francês.

Pouco conhecido no Brasil, o escritor francês Jori-Karl Huysmans colocou na forma de romance sua descida pessoal aos subterrâneos não somente da sociedade francesa do século XIX, mas também da própria alma humana. O romance Là-bas reproduz o tema do satanismo e sua presença em um mundo moderno já tomado pelo Positivismo. Aliás, o século XIX foi o século otimista e racionalista por natureza, mas a presença de algumas trevas da Idade Média ainda se faziam presentes. [Read more…]

Resenha: The Demon (O Demônio), de Hubert Selby Jr

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Impressionante e assustador. Essas duas palavras são as que melhor definem o livro de Hubert Selby Jr, “The Demon”, que é um clássico do autor sem tradução em português. Selby Jr tem um estilo peculiar de escrita no qual ele não usa aspas ou, por exemplo, travessão, quando algum personagem vai iniciar alguma fala. Seu inglês é simples, apesar de que algumas expressões idiomáticas tornam a leitura um pouco difícil em algumas passagens.  Ele também foi o autor do livro “Requiem for a Dream” levado ao cinema no ano 2000, e que teve o título no Brasil de “Réquiem para um Sonho”. Selby Jr ficou conhecido por abordar o submundo da sociedade americana, mas isso não deve enganar quem lê The Demon, pois aqui o autor conseguiu alcançar um nível de profundidade que fala ao Homem de todas as épocas. [Read more…]