car c’est de la que tout commence à tendre vers ici-bas ses rayons admirables, de là que jaillit la generation de la matière avec ses formes varièes et multiples
Porque é a partir de lá que começa a tender para aqui abaixo seus raios admiráveis, daí a geração da matéria com suas formas variadas e múltiplas.
Oráculos Caldeus
O célebre Eriképaios, que carrega Métis, a semente dos Deuses.
Orphica
O verdadeiro filósofo não tem tempo a perder com bufões (pensadores ou cientistas) que, como Heráclito, pensam que tudo está em fluxo.
Proclo Lício, o Sucessor, Comentário ao Crátilo
O filósofo platônico inglês Thomas Taylor definiu bem o perigo da “ciência apegada excessivamente à experiência, que afasta a mente da especulação da essência, lançando o espírito em nada além do reino da matéria escura e deformada, o reino da ilusão e do não-Ser” (1801, p.152).
Este alerta de Taylor funciona muito bem para a pretensa ciência do Evolucionismo darwinista. Poucas teorias causaram tanto impacto, e ao mesmo tempo, diante de sua incrível ambição, que vai muito além da “ciência”, mas atravessa também questões morais, filosóficas e religiosas, possui tão poucas evidências de sua validade e é terrivelmente mal explicada.
Li as duas obras principais de Darwin, A Origem das Espécies e A Descendência do Homem, tentando achar ali as respostas para o que Darwin pretendia e por que esta teoria causa tanta discussão. Foi uma decepção já prevista. Os dois livros são muito ruins, exibem uma ciência primária e de nenhum valor para o filósofo, nada mais sendo do que aquilo que Platão colocava no nível mais baixo de conhecimento científico, que é apegar-se ao sensível, às impressões, e a partir disto fazer uma indução de magnitude colossal. Ali existem escassas passagens que mencionam a palavra “evolução”, que jamais é definida, o que já demonstra a invalidez de tal “ciência”, e incontáveis repetições da palavra “hábito”. Darwin gostou muito desse termo, talvez tenha lido excessivamente a Ética a Nicômaco de Aristóteles e resolveu colocá-la como um deus ex machina para explicar tudo aquilo que não tem explicação. Se em Aristóteles a virtude é hábito, será que a evolução ou o desenvolvimento de um órgão é hábito também?
Outro termo que ele utiliza bastante é “inconsciente”, de novo, sem dar um esclarecimento sequer que fosse. O que significa uma ciência que quer solucionar nada mais nada menos do que a origem da vida, das espécies e do Homem, que tem como alguns dos fundamentos principais “hábito” e “inconsciente”? Diante de um filósofo verdadeiro, observações sobre o pescoço da girafa, e se os macacos e os cachorros têm um comportamento parecido com algumas tribos humanas em algum canto remoto do planeta, nada valem. “Inconsciente” e “hábito” parecem termos mágicos para Darwin como o são “livre-arbítrio” para os cristãos, e “meritocracia” e “mão invisível” para os liberais. Nenhum deles acredita, de fato, nessas palavras, mas o expressam como armas de defesa
Aqueles filósofos da Antiguidade souberam muito bem definir a ciência como o estudo das causas. Darwin pretende fundar sua ciência sem remontá-la à causa da Evolução em si. Evoluir é passar de um estado inferior para outro superior. Se sua teoria tivesse se contentado com a “seleção natural” talvez ele tivesse criado menos problemas para si e desaparecido da história das ideias. Como, no entanto, pegou a palavra “evolução” de Herbert Spencer, sem compreendê-la, pois estava acima de suas capacidades intelectuais, desconhecendo a filosofia completamente, um sério problema surgiu. Uma passagem do Sofista de Platão (252c) define bem o problema evolucionista: são incapazes de se manterem longe de expressões sobre o Ser, e criam o inimigo e seu futuro opositor em sua própria casa.
O drama da Teoria da Evolução começa com uma coisa bem simples, em particular para quem usa o verbo evoluir: evoluir como e por quê? Defina, antes de qualquer coisa, a perfeição do Todo, como diz Platão no Sofista (245d). Quem não o fizer, diz Platão, não está capacitado para falar do Ser e nem do vir-a-ser. Estamos esperando até hoje uma resposta dos evolucionistas…
O grande filósofo neoplatônico Proclo nos leva a uma segunda pergunta óbvia: qual é a causa da evolução?
Pois ou não existe uma causa de nenhum ser ou as causas das coisas finitas orbitam em círculo, ou a ascensão (progressão) é para o infinito, e uma coisa é a causa de outra, e a pré-subsistência da essência (causa) não irá de forma alguma cessar. Se, entretanto, não há causa dos seres, não haverá nem uma ordem de coisas secundárias e primárias, de coisas aperfeiçoadas e perfeitas, de coisas que decoram e de coisas ornamentadas, de coisas que geram e geradas, e de agentes e pacientes, nem mesmo haverá uma ciência dos seres. Pois o conhecimento das causas é o trabalho da ciência, e nós dizemos que conhecemos cientificamente quando sabemos as causas das coisas. Mas se as causas orbitam em círculo, a mesma coisa será anterior e posterior, mais poderosa e mais débil. Porque toda coisa que produz é melhor do que a natureza daquilo que é produzido. Nem faz diferença juntar causa e efeito, e através de muitos ou poucos meios produzir pela causa. Pois a causa será superior a todas as naturezas intermediárias daquilo que é a causa; e quanto mais numerosos são os meios maior é a causalidade da causa.
Proclo de Constantinopla (1909, p.11)
Toda a Teoria de Darwin teria de ter uma volumosa literatura expondo as respostas para as perguntas anteriores. Essa literatura não existe, e não será possível fazer uma análise dialética sobre ela. Deveríamos, portanto, fazer uma análise sobre a perfeição do Todo, sobre a evolução e, não devemos esquecer, sobre o misterioso organismo inicial que deu origem a toda extraordinária variedade de formas de vida do planeta Terra. Muito se escreveu sobre o ancestral em comum do homem e dos primatas (que só pode ser um primata), mas ignoraram que o ser humano tem o mesmo ancestral em comum com os dinossauros, elefantes, vermes e baratas…
Vejamos o final da citação de Proclo: quanto mais são numerosos os meios, maior é a causalidade da causa. Como o evolucionismo rejeita seja Deus ou um Criador, assim como toda finalidade, mas admitem este organismo original, só podemos especular que este organismo seria um deus, caindo assim em um panteísmo que assustaria até Spinoza…se seguirmos o caminho apontado pelos evolucionistas, podemos dizer que, na verdade, houve uma involução. Nenhum ser, nem mesmo os humanos, podem ser comparados com este organismo original que continha dentro de si toda a potência da vida. É bastante pueril, da mesma maneira, definirmos os seres como uma “evolução” de algo que veio antes, pois não era a intenção original de Darwin (2009, p. 61).
O verdadeiro teórico da evolução foi o filósofo Herbert Spencer, pois a verdadeira teoria de Darwin era a da seleção natural. Como todo filósofo que se preze, Spencer desce do universal para o particular, o que era incompreensível para Darwin (2009, p. 78). Uma teoria tão complexa como a da Evolução obrigatoriamente deve ter uma filosofia que explique seus princípios, porque ninguém imagina que ela se sustentaria apenas com as comparações e observações de Darwin. Étienne Gilson faz uma observação sagaz em seu livro sobre isso. Thomas Huxley, avô do famoso escritos Aldous Huxley, e conhecido como buldogue de Darwin, escreveu o artigo sobre o evolucionismo na Enciclopédia Britânica. Huxley, o que pode parecer surpreendente para nós nos dias atuais, credita a Darwin apenas as observações no reino da natureza da Evolução (que ele não menciona na Origem), mas a discussão total da Evolução foi feita por Spencer, escreve ele (2009, p. 87).
Mesmo que Darwin se atenha à seleção natural e não à ideia de que uma espécie surja a partir de uma anterior, nem assim escapa de alguns problemas. Filósofos costumam ser chatos, porque gostam de perguntar, de incomodar, e onde a ciência se detém, aí entra a filosofia.
Sua seleção natural é todo-poderosa e explica tudo. Leia-se uma aula sobre como o morcego desenvolveu asas: Os morcegos, como já demonstramos, adquiriram provavelmente as asas deslizando primitivamente no ar para se transportarem de uma árvore para outra, como os supostos esquilos voantes, quer para escapar aos inimigos, quer para evitar as quedas… (2003, p. 243). O livro inteiro é uma apologia da finalidade, mas agora apela-se não mais a Deus, mas para a tal seleção natural. Vamos nos ater à citação em si, no entanto. Darwin, de maneira aparente, acreditava então que o reino da liberdade é o reino da matéria. Não há limites para este reino infernal do vir-a-ser de seu mundo. Enquanto tantas religiões e filosofias viram no corpo e na matéria uma das manifestações do mal, em Darwin a matéria tem um poder ilimitado. Poucos anos antes, o brilhante filósofo alemão Arthur Schopenhauer escreveu um livro com o título de A Vontade na Natureza. Em uma passagem, ele define bem homens como Darwin, que em seu tempo afundavam no materialismo mais vulgar das ciências, ignorando o todo:
O lado imediato mais ofensivo é menos a bestialidade moral de seus resultados últimos, do que o absurdo incrível de seus princípios primeiros. Por eles a força vital é negada e a natureza orgânica é degradada é um mero jogo da sorte das forças químicas…[…] o mero estudo da química qualifica o homem para ser um apotecário, mas não um filósofo (1903, p. 194).
Na filosofia de Schopenhauer o princípio da individuação, que também é o princípio do mal, é o espaço-tempo. Descer em um corpo físico nas condições do espaço-tempo é sempre um mal porque há uma severa limitação de nosso ser. Platão e os gnósticos da Antiguidade já sabiam disso, porque o que ocorre na descida é uma perda, e não um ganho. O reino da liberdade em Schopenhauer (e em Kant) só pode ser o mundo noumênico, e jamais o mundo do fenômeno. Por isso em Schopenhauer não pode haver livre-arbítrio, porque cada um é a manifestação física da sua Vontade noumênica. O mesmo ocorre com os outros seres vivos.
No bizarro universo de Darwin é como se os seres vivos tivessem este “livre-arbítrio” para modificarem seus corpos e sua estrutura esquelética para sobreviverem aos desafios da natureza. O morcego era um rato sem asas, a partir da luta pela sobrevivência ele chega à conclusão (?) de maneira inconsciente (!) que precisa de asas para continuar existindo. Foi-se o tempo da natureza não faz nada em vão, daí ele começa a arrastar-se e, a partir do hábito, as asas se desenvolvem. Nem mesmo Darwin sabe quanto tempo isto levaria, mas presume-se que um período considerável. Schopenhauer, ironizando Lamarck, diz que, até que qualquer animal desenvolvesse o novo órgão, ele já estaria morto há muito tempo (1903, p.263). Como Darwin era um ignorante em filosofia, nunca poderia elevar-se além do sensível e subir a níveis mais altos. Esta citação dele está situada no âmbito da crítica de Schopenhauer
porque as novas variedades se formam muito lentamente. A variação, com efeito, segue uma marcha muito lenta e a seleção natural nada pode, até que se apresentem diferenças ou variações individuais favoráveis, e até que se encontre, na economia natural da região, um lugar que melhor possam preencher alguns dos seus habitantes modificados. Ora, estes novos lugares produzem-se apenas em virtude de mudanças climatéricas muito lentas, ou depois da emigração acidental de novos habitantes, ou talvez, e numa escala maior, porque, modificando-se lentamente alguns dos antigos habitantes, as antigas e as novas formas assim produzidas atuam e reagem umas sobre as outras. Resulta disto que, em todas as regiões e em todas as épocas, devemos encontrar apenas poucas espécies apresentando ligeiras modificações, permanentes até um certo ponto; ora, é este certamente o caso. (2003, págs. 189;190)
Cada espécie é a manifestação visível desta Vontade que existe no mundo noumênico, e já desce ao sensível preparada para expressá-la, como ensina Schopenhauer:
Mas o organismo não é nada além da Vontade se tornando visível…as necessidades e os desejos daquela Vontade darão a cada fenômeno as regras para que os meios sejam empregados, e estes meios deverão harmonizar-se um com o outro. Sobre a Vontade na Natureza
O filósofo alemão cita Aristóteles para reforçar sua tese
Τὰ δ’ ὄργανα πρὸς τὸ ἔργον ἡ φύσις ποιεῖ, ἀλλ’ οὐ τὸ ἔργον πρὸς τὰ ὄργανα
Os instrumentos trabalham para a natureza de cada coisa, e não para os próprios instrumentos. (tradução nossa a partir do grego)
Aristóteles, Περὶ ζῴων μορίω (De Partibus Animalium) IV.6
O neoplatônico Simplício escreveu
“Ού μόνον συγχωρών ήρμόσϑαι τό σώμα τών ζώων αλλά καί συλλογιζόμενος αύτό συγχείσϑαι μέν τό ζών σώμα καί χεχράσϑαι συμμέτρωσ εξ έναντίων ώς έναργές λαμβάνων “
Uma ordenação única acompanha e une o conjunto dos animais, mas também calcula e mistura, e faz os corpos dos animais observarem as medidas e simetrias corretas através de diferenciações assumidas.
Simplício da Cilícia, Comentário ao De Anima de Aristóteles. (tradução a partir do original em grego)
Cada órgão está já previsto no todo e a espécie não tem a liberdade ou a capacidade de refletir, aqui nas condições do mundo, sobre modificações em seu próprio ser. A metafísica de Proclo coloca desta maneira
porque nenhum organismo é, devido à sua natureza, competente para retornar a si mesmo. Pois, se o que é convertido em qualquer coisa é conjugado com aquilo que é convertido, é evidente que todas as partes do corpo que se convertem serão unidas a todas as partes.
Proclo Lício, o Sucessor (Πρόκλος ὁ Διάδοχος), Elementos de Teologia (1909, p.14)
Na Teologia de Platão está escrito
O princípio dos seres é incorpóreo, pois é através deste poder que o sujeito sempre é. Portanto, é impossível que o princípio dos seres seja corpóreo. (2010, p. 118)
Se ficarmos presos às noções evolucionistas só teremos diante de nós as trevas mais obscuras da matéria e do vir-a-ser. Se produzir ciência sempre foi algo difícil e para poucos, apesar do total desconhecimento do darwinismo milênios antes, o quão difícil seria estudar algo que estaria sujeito a tantas transformações, e também devemos levar esta hipótese para o plano da ética também. Nenhuma ciência nem mesmo provável seria concebível, e o próprio evolucionismo já estaria datado. O Evolucionismo é o reino do não-ser, segundo a definição dada por Platão no Sofista. É um insuportável discurso sobre aparências e sobre prática (254 a). Considero inútil tentar levar o debate com algum cientista evolucionista para o plano do imaterial, um debate sobre as Formas. E nem devemos fazer com que o filósofo desça ao nível d experimentalismo de Darwin.
Quando comparamos o Evolucionismo e o Criacionismo ambos estão errados e são impossíveis como ciência. Entretanto, o Criacionismo tem a vantagem, em termos filosóficos, de ter uma vasta literatura sobre a causa da Criação, isto é, sobre Deus; já o Evolucionismo é obcecado com chimpanzés, mas ignora totalmente a causa da evolução, a origem em si dos seres vivos. Não é uma ciência, e como filosofia é péssima. Na parte filosófica o evolucionismo comete o mesmo erro de Aristóteles, em um nível, claro, mais tosco, que é o de lançar as possibilidades totais da espécie (Darwin) e do indivíduo (Aristóteles) no plano sensível. Para os grandes filósofos gregos, que ignoravam e desprezariam o historicismo cristão e darwinista, pois o último é uma herança da obsessão cristã com datas, os fundamentos evolucionistas seriam risíveis. Não havia Criação para eles, o universo sempre existiu. As possibilidades de cada ser já foram dadas desde sempre, e não há transformismo algum. Alguém precisa alertar os darwinistas que não existem apenas duas opções possíveis: darwinismo ou criacionismo. Ninguém precisa escolher entre os dois, mas rejeitar ambos.
Damáscio (Δαμάσκιος, 458-538) e os Problemas e Soluções dos Primeiros Princípios- ἀπορίαι καὶ λύσεις περὶ τῶν πρώτων ἀρχῶν
Μητε κατω νευσεις εις τον μελαναυγεα κοσμον
Ωι βυθος αιεν απιστος, υπεστρωται τε και Αδης,
Αμφικνεφης, ρυποων, ειδωλοχαρης ανητος,
Κρεμνωδης, σκολιος, πωρον βαθος, αιεν ελισσων
Αιει νυμφευων αφανες δεμας, αργον, απνευμον.
nem você deve olhar para baixo para o mundo esplendidamente escuro, cujas profundezas são sempre infiéis, e cujo o fundamento é o Hades. Um lugar de toda a maneira nublado, esquálido, que se regozija em imagens, estúpido, desamparado pelo bem, íngreme, sinuoso, com uma profunda cegueira, girando sobre si mesmo, sempre se casando com um corpo inaparente, lento e que não possui o sopro da vida.
Oráculos Caldeus
Na Origem das Espécies, Charles Darwin não fornece explicações sobre como as espécies surgiram. Ele dá um salto para seu tema favorito, que ele agarra tenazmente, que é o da seleção natural. Ele acredita com todo o fervor que as espécies surgem a partir da seleção que a natureza faz entre aquelas que são as mais aptas a sobreviverem. A mais adaptada teve origem em outra que em algum momento foi a mais adaptada; as menos adaptadas foram sendo eliminadas ao longo do tempo. Nem é preciso muito esforço para notarmos que, se a natureza funciona desta maneira, então ela jogaria com a sorte a todo momento. A pergunta a ser feita é por que ela não coloca de uma vez por todas as espécies mais adaptadas de uma vez por todas em cena?
Se Darwin estivesse correto, cada ser teria dentro de si, neste plano, sua essência e sua manifestação fenomênica totalmente integradas e imanentizadas. Este mundo seria também o das escolhas e as espécies teriam tal capacidade de modificação, de olhar para sua própria essência, que fica impossível não passar por cima de toda a história da filosofia e da religião. Se existe uma seleção natural, ela teria ou não consciência de suas próprias escolhas? Darwin escolheu pela inconsciência porque isso o livrou de perguntas incômodas. Apela-se ao desconhecido. Os gregos possuíam uma ideia da gênesis bastante diferente:
a geração era concebida pelos gregos como um período de tempo filosófico entre o estado de ousía (οὐσία), ou essência, para o estado momentâneo de fenômeno no reino da natureza. O movimento da metalepsis ( μετάληψις), ou existência fenomênica, é distinto de seu ser real. No nono dia dos Mistérios de Elêusis, os participantes pronunciavam as palavras FILHO e GENETRIX, dizendo, assim, que os seres humanos são a prole da eternidade e a natureza sua mãe.”
“A gênesis dos filósofos era a externalização, o vir-a-ser, a transição do incondicionado para o condicionado, do noumênico para o fenomênico. Este contraste é demonstrado de maneira magistral no evangelho gnóstico de João: “antes que Abraão existisse, eu sou.
Alexander Wilder, comentário aos Elementos de Teologia (tradução nossa a partir da versão em inglês)
Darwin e seus seguidores têm a audácia de passarem por cima de toda a história da filosofia e a eliminam junto com a religião. A descida envolve uma perda, principalmente a da verdadeira liberdade noumênica, esta vida da própria essência, para este Hades que precisa da iluminação deste nous. Mas no Evolucionismo, o otimismo é intenso, porque só se evolui, nunca se decai. Qual a necessidade de uma reflexão racional sobre algo se a natureza age de forma inconsciente e sempre para o melhor? A psicologia moderna conhece muito bem o poder destrutivo do inconsciente. Por que deveríamos aceitar que Darwin lance sobre nós este termo sem medir suas consequências?
Damáscio, conhecido como o último dos neoplatônicos do Ocidente antes que a barbárie tomasse conta do mundo e da filosofia, produziu uma obra monumental sobre os Princípios. Serviu-se muito dos Oráculos Caldeus para enriquecer sua filosofia. Na epígrafe deste capítulo está o alerta sobre o perigo de olharmos para a matéria isolada das Formas e da ciência. Ele recorda que a razão somente tem a intuição das espécies, alcançada apenas pela dialética em um nível noético, e que sem que a dialética as unifique, não alcançaremos nem o Uno nem o Ser (livro 1, p.14). Numa imagem muito bela, Damáscio crê que a visão das espécies está proporcionada à nossa visão sensível-como não vemos as estrelas em toda sua extensão, nem quando estamos de longe vemos os detalhes das montanhas-, pois esta não conseguiria suportar seu intenso brilho (livro 1, p.203).
Os evolucionistas tendem a puxar a história da própria evolução para cada vez mais perto de nós enquanto evitam os problemas das origens. No início, todo o universo deveria ter preparado o terreno para que a vida surgisse e, de maneira muito provável, isto também foi inconsciente. Mas será que, se o universo estava evoluindo, por que a vida em si teria que ter começado em um nível tão baixo? Porque Damáscio ensina a doutrina platônica da matéria primeira que precisa da impressão das Formas, pois a mesma é apenas uma matéria em potencial. Mas a matéria em potencial do universo já não estava em evolução? Ao menos é o que se sugere, já que as Formas geométricas dos astros pressupõem uma inteligência ativa. Os gregos consideravam os planetas Deuses, e sua natureza superior à dos seres humanos. Não haveria necessidade, portanto, de um novo começo, porque o universo já havia evoluído. A matéria primeira não pode pensar por si mesmas e atribuir-se uma Forma. Só mesmo a matéria segunda, após a impressão das Formas, pode mostrar sua existência (Livro 1, p. 46).
Darwin comete um erro metafísico gigantesco que é o de ater-se à multiplicidade, ao variado. Como demonstra Damáscio, caberia então ao nosso cientista demonstrar a ligação que existe entre toda esta multiplicidade; se elas são a causa uma das outras, então formarão um círculo, portanto, serão unas, e não mais múltiplas, não sendo, então, espécies (Livro 1, p.9).
No Timeu, Platão já havia dito que nossa alma é um círculo, e o movimento dos astros é também um círculo. Este movimento, diz Damáscio, é semelhante ao movimento da razão, imagem do verdadeiro imóvel (Livro 2, p. 41). Nossa razão é uma imagem imóvel dentro de um corpo móvel. Este imóvel, explica Damáscio, é imutável segundo a substância, e não admite acréscimos como que adicionado por alguma entrada ou janela, não tem nada haver com algum suposto hábito exercitado no sensível.
É importante que tenhamos em mente que Spencer, o verdadeiro inventor da “Teoria da Evolução”, como demonstrou Étienne Gilson, via que a evolução não era algo sem um término, mas sim o cessar do movimento e uma integração. Damáscio vê nos corpos uma força de integração e dissolução, com uma razão imóvel (Livro 2, p. 92). Spencer definia a vida como força de integração, desintegração, segregação e dissimilação (Ibidem). Mas Darwin não tinha a visão do filósofo e perde-se em múltiplas observações. A Sofia (Sabedoria), diz o Oráculo, é ver a verdade através dos pensamentos múltiplos (Livro 2. P.208).
Na filosofia grega não haveria lugar para uma brutal luta pela sobrevivência sem uma finalidade, uma natureza sem providência no qual as espécies nascem e morrem em um processo inconsciente. Na mitologia temos a grande Hécate, que governa a natureza, o mundo e suas obras a fim de que o céu contemple seu estágio eterno, como diz o oráculo.
Bertrand Russell criticou a Teoria da Evolução com base na lei da entropia. O universo está perdendo força e caminha para a desintegração. Mas Darwin não pode ser caracterizado como se opondo a esta lei porque em seu universo há uma regressão não explicada a uma desorganização. Uma inteligência produz leis físicas extraordinariamente complexas para depois regredir a um estado inconsciente na criação da vida. Na metafísica neoplatônica de Damáscio, não existe uma necessidade de uma evolução sujeita a inúmeros contratempos. Nela, a união do eterno e do temporário se eternizam a cada ser (Livro 3, p.137).
Os Elementos de Teologia de Proclo
O darwinismo representa a negação total das Formas platônicas e de seu reflexo na matéria. Darwin só produziu um raciocínio espúrio, na visão platônica. Nenhuma figura ou magnitude serão inerentes à matéria, dizia Plotino, pois são Formas. Pag 91
O avanço gerado por Platão no seu antológico Parmênides foi imenso. A Unidade e a Multiplicidade foram vistas pelo poder da dialética permitindo que cada multiplicidade seja remetida à Unidade como unidades auto aperfeiçoadas (1909, p. 382). A metafísica entra aqui para iluminar a ciência, mas ela em si não pode estar sujeita à experiência.
A matéria era definida pelos gregos como a vida última. Tanto Platão quanto Aristóteles, diz Thomas Taylor, viram no movimento como medido pelo tempo, e todos os seres vivos possuem este movimento que está sujeito à geração e à corrupção, não possuindo estabilidade, estando localizados no vir-a-ser. O verdadeiro Ser não pode estar localizado no tempo, mas na eternidade (1812, p. 166).
O Evolucionismo é uma verdadeira aberração ontológica, pois as espécies são lançadas no mundo sem estarem preparadas para ele, e só através de um mecanismo inconsciente, a espécie passa a ter consciência (?) de que precisa evoluir. Isto estando já na matéria. Os gregos, mais sábios, já asseguravam que o mais perfeito precede o imperfeito (1812, p. 203). Como uma espécie pode saber o que é evoluir e o que é melhor ou pior?
Proclo proclama a volta de todo ser vivo á sua essência; se sua natureza pudesse progredir para além de sua essência, esta volta seria impossível. Todos os seres vivos, inclusive os seres humanos, sentimos saudades de nossa causa geradora, de nossa essência, que está localizada na eternidade. Por isso, dizia Schopenhauer, a natureza não se altera com a morte de nenhum de seus filhos porque sabe que todos voltam ao seu seio, onde estarão protegidos.
O reino da multiplicidade sem a unidade impede qualquer ciência do Ser, diz Proclo (1909, p.10). Tornar-se-ia impossível qualquer ordem ou progresso, não saberíamos que é o primeiro ou o segundo, e toda a energia seria dispersada. O conhecimento das causas é o trabalho da ciência, ensina. A Teoria de Darwin não possui causa, logo não é ciência. No darwinismo, cai-se no erro ontológico vislumbrado por Proclo de que sem causa, os seres serão ao mesmo tempo os melhores e os piores, anteriores e posteriores. Tudo aquilo que produz tem uma natureza melhor do que aquilo que foi produzido (ibidem). Seres humanos geram outros seres humanos (iguais a ele em essência) ou máquinas e tecnologias (inferiores a ele). Nenhum ser humano pode gerar um anjo ou um deus; é impossível em termos ontológicos. Assim como primata algum gera um ser humano.
O que estivesse totalmente localizado no vir-a-ser não seria um verdadeiro Ser. O Ser verdadeiro participa da eternidade e do temporal. Na primeira tem sua estabilidade; na segunda, subsiste imitando a natureza imortal (1909, p. 44). Em tudo que escreve Proclo vemos a presença da ciência verdadeira; ele não joga com nossa inteligência atribuindo o que desconhece a mecanismos inconscientes.
Nem mesmo se as espécies pudessem pensar em algum tipo de evolução o darwinismo se salvaria. Proclo comprova que toda a sabedoria consiste em primeiro, olhar para dentro de si e, depois, para o que está acima de si. Jamais a sabedoria consiste em olhar para o que é externo a si mesmo, para o que vem depois. Ignorando o que cada ser é, como poderia sobreviver e saber o que é melhor para si? (1909, p.122). Só é possível uma “evolução” quando sabemos aquilo que é anterior a nós mesmos (1909, p.137)
A Teoria da Evolução nega o Universal e o que é Superior, por isso está longe do reino da ciência, que consiste em primeiro conhecer o Universal e o Superior, para depois baixar até o particulares e inferiores (ibidem). O que é curioso em Proclo é que a natureza tem mesmo um caráter involutivo, em razão da atuação da matéria e do tempo nos seres, de tempos em tempos existe um circuito restaurativo (apocatastático) nos seres ao seu estado original (1909, p.145).
Foi mencionado que é uma ingenuidade considerar que só temos a opção de Darwin ou o Criacionismo bíblico. Platão, Aristóteles e os gregos viam o mundo como um animal divino, que sempre se renova em suas energias, mas cuja essência é a mesma, indestrutível e capaz de renovar-se sempre. A vida dos diversos seres não surgiu por uma combinação fortuita de elementos, porque a natureza não faz nada em vão, escreve Taylor, desta forma a vida é gerada por poderes incorpóreos produzidos pelas grandes totalidades, que são vislumbradas apenas pelos filósofos, e não pela ciência positiva, criadora apenas de ateísmo (1812, p. 463). O planeta Terra é um animal prolífico, que faz surgir sempre novas formas. O ser humano, sendo um Deus criado, faz a negentropia propagar-se pelo uso de sua inteligência, espalhando sua energia criativa que vira um patrimônio da humanidade. Esta concentração de energia ganha cada vez mais força pelo aumento gradativo da população, sendo assim, agimos como demiurgos em escala reduzida, produzindo a verdadeira e autêntica evolução.
Fontes consultadas:
DAMASCIUS LE DIADOQUE, Problèmes et Solutions touchant les Premiers Principes (ἀπορίαι καὶ λύσεις περὶ τῶν πρώτων ἀρχῶν, 3 livros) , Paris: Ernest Leroux Éditeur, 1898.
DARWIN, Charles. A Origem das Espécies. E-book: Porto, 2003.
GILSON, Étienne. From Aristotle to Darwin and Back Again. San Francisco: Ignatius Press, 2009.
PLATÃO. O Sofista. Edipro: São Paulo, 2013.
PROCLO. Theology of Plato. Tradução de Thomas Taylor, 2010.
PROCLO. Proclus’ Metaphysical Elements. Missouri: Thos M. Johnson, 1909.
SCHOPENHAUER, Arthur. On the Will in Nature. Londres: George Bells and Sons, 1903.
SIMPLÍCIO. Commentaria in Aristotelem Graeca, Academia Litterarum Regiae Borussicae
TAYLOR, Thomas. A Dissertation on the Philosophy of Aristotle. Londres, 1812.
TAYLOR, Thomas. The Metaphysics of Aristotle. Londres, 1801.