Júlio César, de William Shakespeare

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Uma das melhores obras de Shakespeare, Júlio César é a história de um grupo de conspiradores liderados por Cássio e Casca, que convencem um grande amigo de César, Bruto, a acompanhá-los em seu plano de assassinar o grande general romano.

Todos os diálogos e cenas de Júlio César são excelentes. A psicologia de Bruto e Cássio torna a peça fascinante. César é um personagem de poucas cenas nessa obra, pois o maior destaque é dado a Marco Antônio. A esposa de César, Calpúrnia, acaba por ter uma visão de que a vida de seu marido está em perigo; porém César termina por desdenhar a opinião de sua mulher. Shakespeare produz uma cena parecida com Pórcia, mulher de Bruto. Ela também quer participar da vida do marido, mas não consegue. Certamente se César e Bruto tivessem dado atenção às suas mulheres, suas vidas teriam tido um destino diferente.

Cássio e Bruto e os outros conspiradores matam Júlio César. Marco Antônio pede, através de um criado, para ver o corpo do líder romano. Casca nesse momento sugere uma atitude que Maquiavel sugeriria de uma certa forma séculos mais tarde, ou seja, que eles, assassinos de César, matem também Marco Antônio. Bruto é contra e aceita o pedido de Antônio para que esse último exiba o corpo de César à multidão e faça um pequeno discurso ao povo romano após a fala de Bruto. Cássio é contra, mas a vontade de Bruto far-se-á prevalecer.

Shakespeare demonstra muita genialidade quando escreve os discursos de Bruto e de Marco Antônio. O primeiro a justificar-se e a acusar César; o segundo sendo humilde e exaltando o caráter de Bruto. A opinião pública, maleável desde sempre, passa do apoio a Bruto para a liderança de Antônio.

A cena que se passa na tenda de Bruto entre esse e Cássio é muito boa pela reprodução da tensão entre os dois grandes assassinos. Bruto convence Cássio de que eles estão no auge, e que um movimento de tropas em direção a Filipos é uma boa tática. Todos saem de cena, e Bruto fica sozinho, à luz de velas, com sua consciência. Shakespeare, como sempre usando magistralmente cenas com fantasmas, cria esse diálogo que eu vou manter no original:

Brutus
How ill this taper burns!—Ha, who comes here?
I think it is the weakness of mine eyes
That shapes this monstrous apparition.
It comes upon me.—Art thou any thing?
Art thou some god, some angel, or some devil
That makest my blood cold and my hair to stare?
Speak to me what thou art.

GHOST

Thy evil spirit, Brutus.

BRUTUS

Why comest thou?

GHOST

To tell thee thou shalt see me at Philippi.

BRUTUS

Well, then I shall see thee again?

GHOST

     Ay, at Philippi.

BRUTUS

Why, I will see thee at Philippi, then.
Segue-se a batalha de Filipos e o final trágico e poético de Cássio e Bruto. Muito mais tarde, Dante Alighieri os colocará no nível mais profundo do inferno como traidores dos benfeitores da humanidade.
No fundo dessa tragédia escrita por Shakespeare está a justificativa ou não de se matar um tirano. No tempo de Elizabeth I, não haveriam dúvidas quanto ao fato de que o regicídio seria o pior dos crimes. Júlio César possui essa mensagem, pois Shakespeare foi fiel às fontes históricas e ao medo que seus compatriotas compartilhavam quanto a possíveis conspirações por parte dos católicos, jesuítas ou qualquer inimigo real ou imaginário de sua rainha. Talvez se Bruto tivesse conhecido a doutrina de Maquiavel de que nunca se deve permitir que um adversário ganhe poder, ele teria dado razão a Casca e matado a Marco Antônio. O próprio Maquiavel apoiaria esse fato, uma vez que, como ele dizia ,a crueldade deveria ser feita de uma vez só, e a oportunidade esteve nas mãos dos conspiradores. Tiranos modernos como Hitler e, principalmente Stalin, aprenderiam essa lição.
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